O modelo sindical brasileiro atende as exigências do nosso país? - Alfredo Bottone

O modelo sindical brasileiro atende as exigências do nosso país?

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O modelo sindical brasileiro atende as exigências do nosso país?

Diz o art. 8º da Constituição Federal do Brasil: É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

 

I – a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;

II – é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

III – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

IV – a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;

V – ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;

VI – é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;

VII – o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais;

VIII – é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.

 

Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.

Perdeu-se, naquela época (1988), uma grande oportunidade para que a verdadeira liberdade sindical, vigente na maioria absoluta dos países, fosse uma premissa também aqui no Brasil. Foram mantidos o imposto (“contribuição”) sindical e a unicidade sindical.

Isso não é tudo.  A Constituição Federal deu total força aos sindicatos, porém, não teve o zelo de evitar a proliferação indiscriminada dessas instituições. O aumento do número de sindicatos não representou, de forma alguma, uma maior proteção dos trabalhadores, quer seja quantitativamente, quer seja qualitativamente. Ao contrário, trouxe mais problemas, porque a disputa muitas vezes deixou de ser por conquistas e defesa de interesses dos trabalhadores, mas a “luta” entre diversas facções sindicais.

Inúmeros sindicatos foram criados para abrigar “perdedores” de disputas sindicais, dividindo a categoria. Não raras vezes, alguns desses “líderes” fazem uma verdadeira invasão territorial, fragmentando a base já constituída. Essas atitudes não passariam por um crivo ético se pudesse ser identificada a verdadeira razão da fundação de mais um sindicato.

Sindicalistas protestando em São Paulo, em Maio de 2012 [Paulo Fischer/Futura Press]

Atrás da criação dessa infinidade de sindicatos vem a estabilidade de vários dirigentes, as contribuições para esses “novos” órgãos de representação, a liberação para “trabalhar” em prol da categoria, etc. Isso gera a falta de harmonia e consenso para se ter uma pauta comum para a negociação na data base, enfim, o empregado perde em todos os sentidos e muitas vezes é simplesmente instrumento de custeio da entidade sem ter uma boa qualidade na representação que lhe interessa.

A apreciação crítica acima, logicamente, não é extensiva a todas as entidades sindicais, porque há muitas e muitas que dignificam o seu verdadeiro papel, mesmo quando submetidas a uma concorrência desleal, pelas razões antes citadas aqui.

A verdade é que a lei tutelou, igualmente, os bons e maus sindicatos.

Quem perde com esse modelo? Os trabalhadores e o próprio país. No primeiro caso, porque essa divisão da categoria é perversa para os próprios trabalhadores. Se ao menos houvesse uma unidade em torno dos interesses da categoria dividida, isso poderia minimizar o arcaísmo do modelo vigente. Essa união dos representantes é quase impossível, na maioria absoluta das vezes. O país perde porque com a classe operária fragilizada, por falta de representação ou por falta de consciência do empresário que aproveita a fragilidade sindical para não dar um tratamento digno ao empregado, a pobreza não é erradicada e o desenvolvimento do país (econômico, social e cultural) sofre as consequências.

Descrever a divisão de categoria profissional poderia parecer ser mais lógico se estivéssemos tratando da ação da classe patronal em relação aos trabalhadores, mas não é isso o que ocorre. A classe patronal, na maioria, já percebeu que é mais fácil negociar com quem representa de fato os empregados, com menos pessoas, porém com representatividade inconteste.

A base de representação dos empregados, com esses milhares sindicatos, está pulverizada, confusa, enfraquecida e sem perspectiva de uma configuração mais coerente e forte.

As centrais sindicais que, há pouco tempo, passaram a integrar oficialmente a estrutura sindical legal, têm dado uma boa contribuição na defesa de interesses coletivos. Elas têm melhor coordenado, atualmente, o debate político de questões mais relevantes para os empregados.

Bancos em greve [Fernandos Donasci / UOL]

O fim do imposto sindical e implantação de um modelo de total liberdade sindical, por certo muito iria contribuir para sanear esse quadro poluído de tantas entidades. Sobreviveriam aqueles que os empregados, voluntariamente, elegessem para representá-los e pagariam por isso.

Enquanto houver sindicato que para não correr o risco de perder a fatia de dinheiro do empregado, quando este quiser se opor à chamada contribuição assistencial, criando inúmeros empecilhos para que o interessado exerça esse direito, vamos ficar na dependência da empresa ter uma boa política de RH.

Não é possível manter um quadro sindical como o que temos. É preciso limpar o que é inexpressivo ou que tenha interesse escuso. É possível fazer isso sem a intervenção do Estado, mas se promovendo uma reforma desse artigo da Constituição Federal.

Não se diga que se acabar o imposto sindical, muitos sindicatos irão quebrar e os empregados menos favorecidos deixarão de ter qualquer representação. Isso é discurso de quem quer defender um modelo ultrapassado, vencido e retrógado, não compatível com o novo momento do Brasil.

O modelo sindical vigente é incompatível com as necessidades de nosso país, por tudo o que expusemos acima. Está longe de ser aderente à realidade nos diversos pontos de nosso território. É preciso ter uma reforma total.

 

Alfredo Bottone

Diretor Corporativo de Recursos Humanos da CPFL